Novembro Azul: medo ou vergonha? – Povo na Rua
         

Novembro Azul: medo ou vergonha?

*Psicanalista e professora Sandra Hott

Novembro Azul é uma campanha que tem como objetivo conscientizar sobre a necessidade da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de próstata. Devemos falar sobre esse tema, pois, muitas vezes o machismo e o preconceito do homem atrapalham a procura por atendimento para o cuidado da própria saúde. A dificuldade cultural faz com que muitos só busquem ajuda quando surgem os sinais de agravamento. Nesse caso, o tratamento é mais delicado e longo, aumentando também a necessidade de uma cirurgia.

Sabemos que os modos de dominação estabelecidos culturalmente pelo machismo oprimem mulheres e outras minorias, mas igualmente aprisionam sujeitos do sexo masculino. Existe a ideia de que o sujeito forte é aquele inabalável, que não tem nenhum problema de saúde, a falácia de que o homem não deve sentir dor. Esse pensamento é muito mais comum em gerações passadas, nas quais alguns homens se gabavam de nunca terem ido ao médico. A negação do sofrimento, da doença e da dor pode ser entendida como um sinal de superioridade.

A prevenção de câncer feminino entre as mulheres, ao contrário do que ocorre com a população masculina, já é um assunto corriqueiro. É comum também que as mães levem as meninas para os próprios exames ginecológicos e essa cultura naturaliza as falas e a necessidade de prevenção entre o público feminino. Lamentavelmente, o mesmo ainda não ocorre no que diz respeito à saúde masculina permanecendo incomum que os homens falem com seus filhos e mesmo entre si a respeito do tema. Contudo, essa cultura vem mudando ao longo do tempo e campanhas como novembro azul têm sido fundamentais para alertar sobre um problema que ocorre obviamente durante todo o ano.

Cabe ressaltar que as diversas funções da presença feminina – mãe, esposa, amiga, namorada – podem representar uma força determinante na desconstrução da pretensa invulnerabilidade masculina. Considerando que a maioria dos chefes da família em nosso país são mulheres, essa colaboração se torna mais relevante quando pensamos em mudança de perspectiva sobre os cuidados à saúde masculina. Espaços público de socialização – escolas, mídia, internet – igualmente podem ser estimulados a dar visibilidade para a necessidade de acompanhamento.

Lembrando que 75% dos casos ocorrem a partir dos 65 anos, o que significa que cerca de 35% de homens abaixo dessa idade também podem apresentar o quadro de câncer prostático e isso representa um grande desafio para todos. O processo de diagnóstico de câncer de próstata gera inúmeros conflitos que serão mais árduos quando maior for o preconceito masculino. Um percurso de psicanálise pode ser de auxílio fundamental para ressignificar esse aprisionamento masculino de modo individual. A informação adequada replicada ao longo do tempo no tecido social pode naturalizar os cuidados à saúde masculina como ocorre com a saúde da mulher. São construções e como tais exigem um bom e necessário trabalho de todos.

(*) Com formação e mestrado em psicologia pela UFRJ, Sandra Araujo Hott é psicanalista e professora.