Uma mulher que foge dos padrões, desde quando o tema não era assunto, e tem, desde nova, o apelido de “voluptuosa” está, certamente, preparada para os desafios que a vida pode apresentar. Essa é Carla Daniel, que aproveita a deixa inicial desse breve perfil para dar o veredito. “Sempre fui um mulherão, grandona, não dá para entrar nesses padrões que atualmente dizem que é legal e estético. Acho que cada um tem o seu, cada pessoa tem a própria forma, e acho que tem lugar para todos os corpos brilharem e serem felizes”, esclarece a atriz e cantora, que nasceu no dia 15 de agosto, no fim da década de 60, no Rio de Janeiro. Ela é filha do aclamado diretor Daniel Filho e da atriz Dorinha Durval, além de mãe coruja da jovem Lys.
Desde cedo, Carla mostrou o talento artístico trilhando um caminho que a levou a se destacar tanto nos palcos, quanto nas telas. Sua jornada artística teve início nos anos 1980, quando ainda adolescente, iniciou a carreira na televisão, em papéis marcados, tanto pela atuação, como pelo canto. Atualmente, está empenhada e focada na carreira como cantora. No dia 21 de fevereiro, nessa quarta-feira, vai fazer mais uma apresentação com o seu grupo “Carlota e os Joaquins” no Blue Note Rio, localizado na Avenida Atlântica, defronte à Princesinha do Mar.
Como tudo começou…
A primeira imagem de Carla, em 36 milímetros, no cinema, foi no filme “O Pobre Príncipe Encantado”. Ela tinha quatro anos e era um filme dirigido pelo pai, Daniel Filho. A criança entrou em cena ao lado da mãe, numa imagem linda, aparecendo na sequência com o veterano e saudoso ator Flávio Migliaccio. Aos oito anos, participou de um programa do humorista Chico Anysio, chamado Azambuja & Cia. A mãe dava vida à personagem Nega Brechó e coube à Carla dar vida à personagem na fase infantil. Bastou faltar dois dias de aula para que a carreira fosse, prontamente, interrompida pelo pai em cinco minutos. Daniel acreditava que o estudo deveria vir antes de tudo. Profissão poderia e deveria ficar mais para frente. Carla, então, ingressou na escola de teatro Tablado, aos quinze anos.
Começou a estudar canto, dança, ia ao cinema, com regularidade, lia a respeito, correu atrás, o que considera muito importante. Assim como estudar enquanto estiver viva. Carla afirma que o fato de ter os pais como trabalhadores da arte influenciaram na escolha da profissão. “Foi o meio em que eu nasci. Poderia estar fazendo outra coisa? Poderia. Mas o meu amor é a minha profissão, que eles me apresentaram e pela qual, graças a Deus, sou apaixonada, foi um bichinho que ficou e me pegou. Desde muito pequena eu sempre acompanhei o trabalho deles, sempre estive junto. E é muito feliz ver o amor e a paixão que eles realizaram e fizeram as coisas”, explica.
Sobre os principais desafios que enfrentou ao seguir os passos dos pais, a atriz e cantora afirma que sempre teve a necessidade de trilhar o próprio caminho e que o pai sempre a respeitou, nesse sentido, o que ela sempre achou muito importante. Carla, no início da carreira, abominava o fato de alguém chegar e falar “Ah, para a filha do diretor Daniel Filho é claro que será mais fácil”. E nesse ponto, chega a discordar. Acredita que seja, inclusive, mais difícil porque precisa provar, até para si mesma, o talento e a garra que a ajudaram a trilhar o caminho do reconhecimento que tem hoje. Mas ser filha de diretor também trouxe privilégios para a carreira de Carla, como a indicação dada pela atriz Marília Pêra para as aulas de canto. Aos dezesseis anos, começou os aprendizados com Vera do Canto e Mello, profissional pela qual nutre um imenso respeito e admiração até os dias atuais.
Novelas da Vida
O carisma e habilidade cênica, rapidamente, levaram Carla Daniel a conquistar papéis de destaque em novelas e séries, tornando-se uma figura querida pelo público. O trabalho em produções, como “Partido Alto”, “Bebê a Bordo”, “Baila Comigo”, “Barriga de Aluguel” e “Por Amor” demonstraram a versatilidade e o talento da artista em interpretar diferentes personagens, deixando uma marca indelével na história da teledramaturgia brasileira. Muitas dessas obras podem ser conferidas pelos telespectadores, tanto no canal por assinatura Viva, como no catálogo de novelas disponíveis no Globoplay, onde suas performances marcantes podem ser apreciadas por novos e antigos fãs.
Sobre a personagem de telenovela favorita, afirma que Dália (de “Chocolate com Pimenta”, sucesso de Walcyr Carrasco, com direção do saudoso Jorge Fernando) foi um presente. “É impressionante. Ela era a minha bonequinha. Sempre tive um xodó”. Carla destaca ainda o papel de Shirley, do seriado “Mulheres”. “Ela tinha uma liberdade sexual e falava sobre tudo, tinha uma colocação que foi muito importante naquela época. Conheci mulheres coniventes a essa forma de pensar. Isso foi muito bacana”, explica.
Outro fato que pontua a carreira dessa multifacetada artista é a entrega, que vai além das cenas que foram ao ar. Para adentrar ainda mais a fundo na vida das personagens, ela, quando vivia uma policial na obra “De Corpo e Alma”, teve aula de defesa pessoal com o lutador Carlson Gracie. Ela lembra, às gargalhadas, que foi a primeira vez na vida em que usou um kimono de luta e aproveitou para exagerar no batom vermelho. “Ele queria ver como eu me defenderia, como iria bater nele. A pressão baixou, sentei no chão e ele teve que ficar sentado ao meu lado, conversando, me acalmando. Esse tipo de embate físico não fazia parte do meu universo. Mas a partir do momento em que ele me explicou, começou a me ensinar, fiquei interessada e até hoje assisto lutas de jiu-jitsu”. Outras tarefas que aprendeu fora de cena para auxiliar na composição das personagens foram aulas de tiro, capoeira, vôlei, aprendeu ainda a dirigir charretes e teve até aulas de montaria.
Carla e a música
Questionada sobre a música da vida, aquela que não pode ouvir, que logo se emociona, Carla revela: “Responder isso, para alguém que gosta, como eu, que ama música é difícil, mas tem algumas muito especiais que são de momentos importantíssimos na minha vida. Uma delas é do Nat King Cole, ‘An Affair to Remember (Our Love Affair)’”. “Essa canção relembra quando eu tinha quinze anos e vivia a primeira grande paixão, platônica. Tem muito significado pra mim”. Piazzolla também é outra referência na vida da cantriz. “Amo ‘Adiós Nonino’. É impressionante como toca a minha alma, sempre que ouço, em qualquer lugar, me emociono e choro”, revela.
Quando abordada sobre o disco da vida, Carla se sente num verdadeiro jogo de sinucas: “Não posso dizer um disco da vida. São milhões. Mas posso citar cantoras que me emocionam profundamente. Uma que eu sempre amei, e, inclusive, fazia a segunda voz quando ficava ouvindo o disco, era a Gal Costa. Sempre amei Gal e amava os shows dela também. Ela Fitzgerald também sempre foi minha paixão. Dinah Washington, Aretha Franklin”.
Recentemente, Carla perdeu o namorado Sérgio Stamile, que era baixista e a incentivou na formação do grupo do qual era integrante, “Carlota e os Joaquins”. Ele morreu, de forma brusca, nas pedras do Arpoador. Antes de falecer, ele a apresentou aos músicos da banda, ex-integrantes da banda Farofa Carioca, que a ajudaram a lidar com a dor do luto. “Eles foram e são muito importantes na minha vida. Me ajudaram a encarar esse momento trágico com mais leveza e é impressionante como quando a gente está realizando um trabalho, fazendo o que ama, ajuda tanto a refrescar a cabeça e a estrutura do nosso emocional. Ser produtivo é uma chavinha muito importante”, explica.
Sobre a proposta do novo trabalho, ao lado dos Joaquins, Carlota desenha: “Queremos levar alegria, felicidade, cantar e dançar. Fico tão feliz de todos poderem estar trabalhando juntos, fazendo o show. É uma realização pessoal minha também. Não posso dizer que não é. Mas é feita com muita dedicação, amor e carinho. Vamos seguir na batalha e com a esperança de que todos recebam essa energia”, finaliza.
Além de uma notável carreira na televisão, Carla Daniel vem fazendo história no mundo da música. A voz marcante e a paixão pelos sons a levaram a participar de gravações musicais, que mesclam diversos estilos, desde o pop até a MPB, conquistando admiradores pela autenticidade e habilidade vocal. Encanta o público e solidifica a posição como uma artista completa. Por trás dos holofotes, Carla é conhecida pela personalidade carismática e simpática. Ela sempre buscou manter uma vida pessoal discreta, priorizando a família e a paixão pelas artes. A dedicação e o talento a tornaram uma referência para as novas gerações de artistas, inspirando aspirantes a seguirem os seus passos no mundo do entretenimento. Sua contribuição para a cultura brasileira é inegável, sendo reconhecida não apenas como uma talentosa atriz e cantora, mas também como um ícone que deixou uma marca na história da arte no país.